Michel Laub

Mês: outubro, 2009

Feriado

Um livro relançadoFome, de Knut Hamsun (Geração, 171 págs.).

Um filme mais ou menosO desinformante, de Steven Soderbergh.

Outro filme mais ou menosDistrito 9, de Neill Blomkamp.

Uma exposiçãoA arte do mito, Masp.

Uma músicaThis is the end, Charlatans.

Uma entrada para pedir no Chi Fu – mexilhão com feijão dentro.

Uma máquina para jogar em grupo (e sem crocodilagem) no fliperama ao lado do Chi fu – Daytona USA.

Uma despedida

Um dos narradores de Últimos pedidos, de Graham Swift (Companhia das Letras, 301 págs.), no momento em que joga as cinzas de um velho amigo no mar:

“Seguro o pote com as duas mãos de novo, dando uma olhadinha dentro, e digo: – Venham, venham. – Se juntam todos pra tirar mais um punhado. Não sobrou muito mais do que o suficiente pra uma rodada pra quatro homens. Mergulham a mão de novo, um por um. Mergulho de sorteio. E eu mergulho e todos nós jogamos outra vez, um ralo de rastro de branco, como fumaça, antes de se ir, e algumas gaivotas se precipitam vindas de não sei onde e numa guinada se agastam de novo, como que foram ludibriadas. Então eu sei que não tem bastante pra uma outra divisão, outra rodada completa, de modo que eu mesmo começo a escavar o resto, parece que eles não se importam. Escavo e escavo como um animal cavando a toca, e no fim eu sei que vou ter que erguer o pote e bater como a gente bate quando chega ao fundo de uma caixa de cornflakes. Um punhado, dois punhados, tem só dois punhados. Digo: – Adeus, Jack. – O céu e o mar e o vento se misturam, mas acho que não faria nenhuma diferença se não estivessem misturados (…). O rosto do Vic e do Vincey parecem bolhas brancas, mas o do Lenny parece uma luz de farol, e do outro lado da água dá para ver as luzes de Margate. Dá para ficar no fim do Píer de Margate e olhar pra Dreamland. Depois jogo o último punhado e as gaivotas voltam atrás de uma segunda oportunidade e eu estendo o pote, sacudindo, como se devesse jogar ele dentro do mar também, uma mensagem numa garrafa, Jack Arthur Dodds, salve nossas almas, e as cinzas que carreguei nas minhas mãos, que eram o Jack que uma vez esteve vivo, são carregadas pelo vento, são rodopiadas pra longe pelo vento até as cinzas se transformarem no vento e o vento se transformar no Jack de que nós somos feitos.”

Música do dia

Via Nina Wop:

Dois filmes de Oliver Stone sobre presidentes republicanos odiados

W – A técnica apurada de sempre, tanto nas imagens quanto na narrativa, e a mão pesada de sempre. Nem falo dos diálogos que pretendem reproduzir a história “real” – e tenho preguiça em saber se foi assim ou não, porque não faz muita diferença –, mas em detalhes claramente direcionados: George Bush dando uma cantada em sua futura mulher com a boca cheia de hambúrguer, ou sendo manipulado de forma infantil por Rumsfield e cia. Enfim, para quem acredita em teorias freudianas literais – a obsessão de W por seu pai – ou na hipótese de que alguém pode chegar à presidência dos Estados Unidos, independentemente do óbvio fracasso político e humano de sua gestão, sendo um idiota quase completo.

Nixon – A mesma obsessão freudiana – desta vez em relação a Kennedy – e a mesma mão pesada nas metáforas – um bife sangrando enquanto à mesa se discute um bombardeio, ou um cavalo que bufa de olho arregalado enquanto um pacto escuso é proposto a J. Edgar Hoover. Mas Stone manipula menos aqui, talvez por estar convencido da contradição entre grandeza e mesquinharia, geopolítica às vezes vitoriosa e constante desastre interno que marcou a gestão Nixon. Uma tragédia em tom grandiloquente, com diálogos eventualmente patéticos, resumida no momento em que Anthony Hopkins e Paul Sorvino se ajoelham para rezar por uma América que já não existia, se é que um dia existiu – aquela de Norman Rockwell, das tortas de maçã no subúrbio, dos desfiles de bombeiros carregando bandeirinhas longe do Vietnã, de Woodstock e do Watergate.

Fim de semana

Uma exposição – Robert Polidori no Museu da Casa Brasileira.

Um livroRobert Polidori: fotografias (IMS, 176 págs.).

Um discoMy maudlin career, Camera obscura.

Um lugar para comer lamen – Aska.

Um lugar para comer lamen gelado e pudim de ovo – Takô.

Uma cena de filme – a da piscina em Deixe ela entrar, de Tomas Alfredson.

Resoluções antecipadas de ano novo (2)

1. Não ler nenhum artigo sobre lei Rouanet.

2. Não comparecer a nenhum debate sobre kindle e pirataria de livros.

3. Não ver filmes com os seguintes temas: situação dos imigrantes na França, incomunicabilidade, Cuba e Islã, classe média brasileira insensível. De segunda guerra, só se Hitler morrer num incêndio.

4. Assistir a somente um filme de Steven Soderbergh.

5. Não assistir ao filme do Lula. Se for inevitável, não comentar. Se for inevitável, não mencionar Glória Pires dizendo “tu vai te chamar Luiz Inácio”.

6. Não ir a nenhum show de sambista da FFLCH, mulher de voz suave que canta bossa nova sorrindo, letrista que faz trocadilho com termos da internet, banda com mais de 50% dos integrantes usando bigode e camisa de lenhador.

7. Não ir a nenhum show em locais sem pia. Ou com pia, mas sem água corrente.

8. Não fazer nenhuma piada sobre: poetas, release de artes plásticas, bebida em vernissage, teatro popular ou do oprimido.

9. Resistir bravamente a: twitter, Máfia Wars, séries americanas, livros sobre futebol aproveitando o gancho da copa, pinball em casa.

10. Não encerrar nenhuma lista fazendo referência à própria lista – “não fazer mais resoluções antecipadas de ano novo” – ou remetendo ao item anterior – “pinball em casa: vai ser difícil”.

(ver resoluções antecipadas 1)

Egopress

1. Aqui, a página que fiz com trechos de críticas dos meus livros.

2.  Aqui, o novo site do Instituto Moreira Salles, projeto que ajudei a montar.

Imagem do dia

Pintura de Dea Lellis:

Fim de semana

Um filmeBastardos Inglórios, Tarantino.

Uma exposição – Rafael Coutinho na Choque Cultural.

Uma músicaJerry Lewis, Lulina.

Um restaurante de massas – Gênova.

Um romance brasileiroEstive em Lisboa e lembrei de você, de Luiz Ruffato (Companhia das Letras, 88 págs.).

Uma expectativa para os próximos meses – o diário Kidids em Passo Fundo, ref. #poschernobyl, na Piauí.

Entrevistas: Martin Amis (2)

(Continuação do post de ontem):

Escritores – “Na Inglaterra, a visão de um romancista sobre um evento político é menos importante do que a de um homem comum. Mas nos Estados Unidos é diferente. Lá há uma longa tradição e uma necessidade de os escritores dizerem ‘o que é a América’ – eles são apenas um agrupamento de italianos, judeus, etc., ou um país com uma alma, uma identidade e um coração?”

Ian McEwan –  “Um escritor maravilhoso. Normalmente acham que estamos competindo entre nós, mas não estamos. Somos amigos, mas cada um está tentando escrever os próprios romances.”

A geração McEwan, Julian Barnes, etc. – “Acho que tudo o que temos em comum é o local de nascimento, que é muito próximo. E a época em que vivemos.”

Literatura nacional e internacional – “A literatura é mais internacional hoje do que no passado, graças à dominação do idioma inglês. É como uma língua franca. O intercâmbio entre escritores é mais comum também. Mas há tantos tipos de literatura quanto autores.”

Os próprios livros – “Gosto mais do próximo. Sempre. Gosto menos dos primeiros (Rachel Papers, Success). O problema de iniciar jovem é que você cresce em público. Isso tem valor, mas o trabalho pode constrangê-lo depois. Os primeiros livros são vivos e cheios de energia, mas parecem um tanto imaturos agora.”

Money – “[o primeiro que livro que escrevi como gostaria foi] Money (…). Não foi minha intenção inicial, mas acabou sendo isso [uma sátira dos anos Thatcher]. A raiva que há ali acabou tendo relação com o desgosto em relação à forma como o país estava sendo governado. Mas você nunca sabe muito o que está fazendo até terminar o livro.”

Time’s Arrow e a narrativa de trás para diante – “Aquilo já havia sido feito antes, como tudo. Há um conto de Scott Fitzgerald [O curioso caso de Benjamin Button] e um romance de Philip K. Dick que o fizeram (…). Achei que era uma idéia poética, mas inútil. Então li The Nazi Doctors, do meu amigo Robert Jay Lifton, e pensei que seria interessante ver o Holocausto de trás para a frente, porque assim, e só assim, a propaganda e a ideologia poderiam fazer sentido, e se poderia dizer o quão errados eles estavam.”

Ideologia – “Estou escrevendo um romance autobiográfico que poderia ser visto como uma resposta às batalhas da guerra cultural que parecem acontecer toda vez que lanço um livro. É sobre uma geração e outra, sobre uma nova ideologia, o igualitarismo, o multiculturalismo. Estou preparado para essa batalha. Normalmente me perguntam se é difícil ser um romancista filho de um romancista. Sempre digo que é fácil, mas agora ficou difícil, porque você é identificado ridiculamente como um elitista genético. E a ideologia está mudando, então agora eu sou o inimigo deles. A idéia de um talento herdado é terrível para essa ideologia, ofende-a.”

Futuro – “Suspeito que o romance voltará a ser o que era quando comecei, isto é, uma esfera menor de interesse. Ele vai se tornar mais quieto, mais para pessoas preparadas ou da academia do que para o público dos best sellers. (…) Para a literatura, foi como um bom período de férias ter tido a dimensão que teve nos anos 70, 80 e 90. Mas isso não me incomoda muito. Quando comecei, era assim. Então não vou me chocar de voltar a esses parâmetros.”

Entrevistas: Martin Amis (1)

(Trechos de uma entrevista que fiz com o autor de Money, London Fields e Casa de encontros em 2004):

O que gosta de ler – “Não procuro por histórias tanto quanto por níveis de percepção. O que quero saber é a maneira como os escritores interpretam o mundo, em que nível isso se dá, mais do que a respeito de sagas familiares ou narrativas tradicionais. Não tem a ver com contar histórias ou não, e sim com como se escreve.”

Ficção hoje – “Você vê o que aconteceu com a poesia na última geração. É como se o mundo se acelerasse em tal dimensão que não podemos diminuir o ritmo o suficiente para ler poesia. A poesia perdeu seu poder na imaginação porque não só desacelera o tempo, como de fato para o relógio. Um poema lírico pede que você examine um determinado momento. E não se gosta mais dessa introspecção. Gostamos que as coisas se movam numa velocidade mais reconhecível. O mesmo se passa com a ficção. Não queremos, ou eles não querem, um tipo de romance de dicção meditativa; preferem um tipo que mais facilmente lembre a velocidade da vida.”

Pós-modernismo – “O grande pós-modernismo europeu está acabado como ficção. Era um grande insight de como o mundo funcionava; não era, no fim das contas, um filão ficcional muito produtivo, rico por si só. Era muito auto-consciente, muito limitado, e agora o romance parece ter evoluído para uma invenção mais ampla. Não há, agora, uma grande tradição dominando o romance. Contar histórias voltou a ser importante. Enredos voltaram a sê-lo.”

O pai, Kingsley Amis – “Meu pai se identificava muito mais com uma narrativa que não pregava peças no leitor. Ele escreveu alguns romances com truques, mas não eram pós-modernos. Você sempre sabia o que estava se passando, as regras da realidade eram estáticas. Na minha geração, há uma maior liberdade em relação a essas regras, com o realismo mágico e o pós-modernismo. A realidade apresentada ao leitor não é tão confiável. Mas agora há um movimento contrário. A próxima geração, suspeito, vai precisar de velocidade e enredo. Interesse humano, não abstrações (…). Nos anos 80, talvez, a presença do pós-modernismo deixasse as coisas mais fechadas. Um romance como Money, por exemplo, enfureceria o meu pai. Aliás, enfureceu… Agora, apesar da liberdade de abordagem, há a volta das leis da realidade ao romance. É a minha impressão.”

Amadurecimento – “Não acho que você possa voltar no tempo e dizer que teria feito diferente. Você fez da maneira como deveria fazer à época. Assim é um romance, ele apresenta dificuldades, e aos 35 você as enfrenta de forma diferente do que quando você tem 55. A sua abordagem, a sua disposição para o risco, tudo muda.”

Crítica – “Você choca por acidente. Os críticos não dirão que estão chocados. Eles não chegaram a dizer isso de mim. Nas críticas, o choque aparece de outra forma: ultraje moral, tradicionalismo.”

Escrever crítica – “Isso sempre foi parte do que fiz. Me parece como escrever com a mão esquerda. Não é algo que venha naturalmente. É encarado mais como trabalho do que acontece quando escrevo ficção. Mas ainda acho importante fazê-lo. Ter vozes críticas vigorosas não é vital para a literatura; é vital para a civilização.”

Imprensa – “[A relação hoje] é pior, no meu ponto de vista. Na Inglaterra eles costumavam atacar a minha pessoa. Agora atacam a minha obra, o que é pior, porque é como atacar meus filhos.”

Egopress

Aqui, entrevista a Paulo Lima, do site Balaio de notícias, sobre O gato diz adeus.

Aqui, em áudio, entrevista a Renato Alessandro dos Santos, do site Tertúlia.

Aqui, matéria de Kelly de Souza, da revista da Livraria Cultura, sobre “livros que gostaríamos de ter escrito”, comigo e outros autores.

Feriado

Um discoLove 2, Air.

Uma memória em quadrinhos – Fun Home, de Alison Bechdel (Conrad, 239 págs.).

Um filme baseado numa memória em quadrinhos – Persépolis, de Vincent Paronnaud e Marjane Satrapi. 

Um burguer – PJ Clarke’s.

Um burguer ainda melhor – Hamburgueria Nacional.

Outros igualmente bons ou melhores – Ritz, Balcão, Lanchonete da Cidade, Rocket’s, Squat, Raupps.

Uma exposição – Dea Lellis na + Soma.

‘Salve geral’

Salve geral escorrega em dois ou três diálogos e dois ou três momentos de esquematismo, mas de resto tem impacto, fluência e atuações muito boas de Andréa Beltrão, Denise Weinberg, Chris Couto e outros. Só que não é o tipo de filme que possa ser criticado apenas esteticamente. Afinal, seria ingênuo ignorar que a própria escolha do tema – o levante do PCC em 2006 e a maneira como o governo de São Paulo lidou com o fato – tem algumas implicações políticas.

Nesse sentido, o diretor e co-roteirista Sérgio Rezende enfrenta o velho paradoxo moral de histórias contadas sob o ponto de vista de bandidos ou concentradas neles. Ou seja, o tempo todo torcemos para que as coisas dêem certo para a protagonista, uma professora de piano que acaba se envolvendo com o crime, e também para Marcola, sua advogada e seus parceiros (todos com nomes trocados, claro). Num western ou policial de ficção não é algo grave, mas numa trama tão colada a uma realidade recente pode haver desconforto ao se ver homens que deixaram famílias inteiras destroçadas serem tratados como revolucionários do sistema prisional, com seu “lado humano” mostrado com tanta ênfase – ou mais – do que seus crimes. É certo que as cadeias no país são hediondas, e que todo assassino é capaz de ser justo nas horas vagas, mas é uma questão de escolha: basta comparar os diálogos carismáticos ou comprometedores que os detentos protagonizam, as cenas em que eles são vítimas ou algozes, o grau de brutalidade que eles sofrem ou fazem sofrer, e aí se tem um discurso.

A favor de Sérgio Rezende, dá para dizer que a abordagem busca uma compreensão das razões do levante, e não seria possível dar conta dela sem apresentar a versão do “outro lado”. Um argumento razoável, mas que parece ter sido pouco lembrado quando o que está em cena são as ações da polícia: ali os personagens têm bem menos relevo psicológico e social, e o filme não se intimida em mostrar um alto agente da segurança pública (que deve ter nome, sobrenome e motivos na vida real) matando dois inocentes à noite, pelas costas. Ou o diretor do presídio (que também tem nome, sobrenome e motivos na vida real) envolvido numa operação que ocasionou o massacre de presos num ônibus. Ou o secretário de segurança (de quem todo mundo sabe o nome e o sobrenome, mas talvez não os motivos) negociando com o PCC e mais preocupado com a imagem do governo que com as centenas de pessoas que morriam nas ruas. Mais uma vez: não duvido que tudo isso tenha acontecido, até porque não conheço os inquéritos da época e seria o último a defender a priori as ações da polícia e das autoridades brasileiras na área. Apenas registro a certeza com que alguns são condenados e outros até o são, mas só depois dos poréns e argumentos necessários.

Entrevistas: Amós Oz

Trechos de uma entrevista que fiz em 1999 com o autor de A caixa preta, Não diga noite e De amor e trevas:

Literatura e família – “Essencialmente, eu me reputo um escritor da vida doméstica. Escrevo música de câmara. Minhas histórias sempre ou quase sempre acontecem dentro do ambiente familiar. (…) A família é certamente o mais interessante dos temas, o mais misterioso deles. É a mais surrealista instituição do mundo. Por 5 ou 6 mil anos a família e o casamento vêm sendo atacados por quase todas as ideologias ou religiões. Jesus defendeu que se pusesse um fim a ela e que em seu lugar se construísse uma comunidade de crentes. Platão sugeriu uma alternativa a ela. Toda nova ideologia ou religião parece começar com um ataque à família. E, de alguma forma, apesar disso, a família sobrevive: no Irã, no Amazonas, em qualquer lugar, sob qualquer regime. Isso é um grande mistério. As pessoas não são monogâmicas por natureza, pelo menos grande parte delas. Mesmo assim, casam-se e jogam o jogo ancestral de pai, mãe, irmão, irmã. Por isso a família é o tema mais universal: todos vivem a tensão e as contradições dessas relações que não se explicam, que são misteriosas.”

Literatura e moral – “[a moral está presente] na minha literatura, sim, mas não penso que isso deva estar em qualquer literatura. Alguns grandes autores não a têm em suas obras. Gogol, por exemplo. Duvido muito que haja moralismo em Kafka. Acho que a obra dele trata mais de metafísica do que de qualquer outra coisa.”

Literatura e política – “Não estou em competição com os jornais. Não acho que seja o meu negócio fazer descrições de Israel como as da CNN. Escrevo sobre os lados mais introvertidos da vida e de Israel. Tento nunca escrever sobre política.”

Local e universal – “Nenhum autor pode ser universal, a menos que o seu tema sejam os aeroportos ou os grandes hotéis. Toda literatura de essência é local e, a partir daí, universal. (…) Cada lugar tem o seu próprio sistema de relações, a sua conformação de valores, a sua combinação de sensibilidades. Minha literatura é israelense porque a maioria dos meus personagens é de Israel. Alguns são árabes, também, mas a maioria é composta por judeus israelenses, que têm histórias pessoais cheias de neurose e perseguição. Todos são sobreviventes, todos viveram catástrofes. Eles ou os pais deles vieram do inferno. Todos são imigrantes cheios de medo e tensão, e isso é muito visível nos meus livros. É aí, também, que está o cenário – seja ele Jerusalém ou o deserto.”

Sobre Operação Shylock, de Philip Roth, que fala da questão judaica numa história passada em Israel – “Comecei o livro, mas depois de um tempo perdi o interesse e acabei desistindo. (…) Acho que ensaístas podem escrever em qualquer lugar, enquanto contadores de histórias deveriam situar essas histórias em lugares que conheçam muito bem. Eu relutaria bastante em escrever uma história sobre judeus que vivem em São Paulo, por exemplo, porque não sei nada sobre a língua, entre muitas outras coisas. Então, acho um equívoco um autor norte-americano escrever um romance sobre a vida de Israel.”

Sobre se acredita em deus – “Acho essa a questão mais íntima que me pode ser feita. (…) É mais fácil falar sobre a minha vida sexual do que sobre isso. Posso dizer que não vou à sinagoga, que não sou um homem religioso. Não acredito em religião e tenho a impressão de que Deus também não está interessado em religião. Um dos meus personagens diz que Deus não é religião. Talvez isso responda a sua questão.”

Fim de semana

Uma exposição – Cartier-Bresson no Sesc Pinheiros.

Um livroHenri Cartier-Bresson: fotógrafo (Cosac Naify, 344 págs.).

Uma reportagem – John Lee Anderson sobre o Rio na New Yorker.

Um filme em DVD – O equilibrista, de James Marsh.

Um restaurante caro e bom – Pobre Juan.

Um show hoje, quinta – Lucas Santtana no Studio SP.