Michel Laub

Mês: julho, 2016

Egopress

Diário da queda teve os direitos vendidos para a Turquia. Até 2017, o livro terá saído em 12 países e 9 idiomas.

O segundo tempo será tema de um dos episódios de uma série de documentários que a produtora Mira Filmes está fazendo sobre livros e cidades brasileiras. Reinaldo Moraes, que apresenta os programas, escreveu sobre as gravações em  Porto Alegre: https://goo.gl/9qDNwR

– Participação minha no projeto Segundas Intenções, com Manuel da Costa Pinto: https://goo.gl/lgORf3

Fim de semana

Uma série – The Night Of.

Outra – Stranger Things.

Uma reportagem – Duas semanas de terror e suas vítimas (aqui).

Um vídeo – 300 gols de Pelé (aqui).

Um disco – Poison Season, Destroyer.

Fim de semana

Um artigo – Zadie Smith sobre o Brexit (aqui).

Uma reportagem – Angels in America, 25 anos depois (aqui).

Uma série de fotos – A Síria antes e depois da guerra (aqui).

Um filme divertido – Elvis & Nixon, Liza Johnson.

Outro – Four Lions, Christopher Morris .

Vida além da vida

James Wood em Como Funciona a Ficção (Cosac Naify, 228 págs. Tradução de Denise Bottmann):

“O realismo, visto em termos amplos como veracidade em relação às coisas como são, não pode ser mera verossimilhança, não pode ser meramente parecido ou igual à vida; há de ser o que devo chamar de vida animada [lifeness]: a vida na página, a vida que ganha uma nova vida graças à mais elevada capacidade artística. E não pode ser um gênero; pelo contrário, ela faz com que as outras formas de ficção pareçam gêneros. Pois esse tipo de realismo – a vida animada – é a origem. É o mestre de todos os outros; ensina também os que cabulam suas aulas: é ele que permite existir o realismo mágico, o realismo histérico, a fantasia, a ficção científica e mesmo o suspense. Nada tem daquela ingenuidade que lhe imputam os adversários; quase todos os grandes romances realistas do século XX também refletem sobre sua própria elaboração e estão repletos de artifícios. Todos os maiores realistas, de Austen a Alice Munro, são ao mesmo tempo grandes formalistas. Mas essa questão será sempre difícil: pois o escritor tem de agir como se os métodos literários disponíveis estivessem constantemente à beira de se transformar em meras convenções, e por isso ele precisa tentar vencer esse inevitável envelhecimento. O verdadeiro escritor, aquele livre servidor da vida, precisa sempre agir como se a vida fosse uma categoria mais além de qualquer coisa já captada pelo romance, como se a própria vida sempre estivesse à beira de se tornar convencional.”

Fim de semana

Um romance – O Encontro Marcado, Fernando Sabino (Record, 365 págs.).

Um filme para ver de novo – Michael Clayton, Tony Gilroy.

Um artigo – Matéria x consciência para homens e objetos (aqui)

Um perfil – Nan Goldin, 30 anos depois (aqui).

Um ensaio – Marcos Nobre e a volta do Brasil aos anos 80 (aqui).

O mingau da destruição

Trechos da reportagem de Consuelo Dieguez sobre o desastre de Mariana/MG, na Piauí de julho:

“Quando as comportas se abriram, a onda desceu com força de catarata. Um mingau espesso da cor de mertiolate, impregnado de rejeito de minério, avançou pelo rio Doce, eliminando a vida existente: peixes, algas, micro-organismos, capivaras que passeavam nas margens, além de toda a vegetação ao redor, que desapareceu como se cortada por uma lâmina. Ao contaminar o rio, a lama, numa reação em cadeia, afetou toda a bacia do Doce, uma região de 86 mil quilômetros quadrados, território equivalente ao da Áustria. No total, 228 municípios foram impactados pelo desastre. Naqueles primeiros dias, seis deles seriam dramaticamente atingidos.

(…)

A 300 quilômetros dali, em Governador Valadares, o empresário Sandro Heringer acordou com a notícia de que a lama invadira o rio Doce. Conhecedor da região, deduziu que em breve a onda chegaria a sua cidade. Com 300 mil habitantes, Valadares é o maior município banhado pelo rio. A relação dos moradores com suas águas é tão estreita que Valadares é a única cidade brasileira a ter uma medalha olímpica de remo (…). No domingo, dia 8, três dias após o rompimento, conscientes de que a destruição do rio era inexorável, a turma do remo se juntou para uma melancólica despedida. Em silêncio, em seus caiaques, mais de 100 remadores, Heringer entre eles, entraram no rio, remaram por um longo tempo e atiraram-se em suas águas. Sabiam que seria a última vez, pelos próximos dez anos, no mínimo, que poderiam repetir aquele ritual.

(…)

Na manhã de terça-feira, dia 10, cinco dias após o desastre, a água em Valadares começou a escassear. No dia 11, com os reservatórios vazios, a cidade entrou em colapso. Os caminhões-pipa contratados pela prefeitura não davam conta de atender a todas as comunidades. A prefeitura exigiu da Samarco a doação de água mineral, o que só foi feito após ordem judicial, já que a empresa afirmava não ter logística para fazer a distribuição. Governador Valadares se transformou numa praça de guerra, com saques a lojas e supermercados, tiroteios e ataques aos caminhões-pipa. O Exército precisou ser acionado. Moradores armados obrigavam os motoristas a desviar os caminhões-pipa para bairros não assistidos. Pessoas com dificuldades de locomoção ficaram presas em casa, com as torneiras secas.

(…)

Vescovi de Aragão [Samarco] botou a culpa em seus subordinados, esquivando-se de suas atribuições. Como diretor-presidente, disse, não possuía ‘responsabilidade direta em relação às barragens de Fundão, Santarém e Germano’; não tinha conhecimento da obra de recuo, aprovada, em 2012, pelo gerente-geral de Projetos; não poderia informar a causa da ruptura porque isso era da alçada do diretor de Operações (…). Ele não tinha nada a ver com aquilo tudo. Mas ainda assim garantiu que no dia do acidente ‘passou suporte e confiança aos funcionários que estavam atuando com a Defesa Civil e os bombeiros’. Mentiu à polícia ao dizer que o plano de ações emergenciais fora colocado em prática, já que tal plano não existia.

(…)

Em dezembro, os agentes federais grampearam conversas telefônicas de alguns funcionários da Samarco e da empresa VOGBR. Pelo que ouviram, concluíram que os executivos de ambas sabiam dos problemas da barragem, mas assumiram o risco de mantê-la funcionando (…). O engenheiro da VOGBR, Samuel Paes Loures, por exemplo, em conversa com o sócio da empresa, Othávio Afonso Marchi, fez um comentário raivoso sobre Joaquim de Ávila, o dono da consultoria Pimenta de Ávila [que fez parecer apontando a falta de segurança da barragem]: ‘Ele foi o único que jogou merda no ventilador e levantou a bola para a polícia. O curso da investigação mudou por causa dele. A gente tem que sair fora dessa.’ E, mais adiante, admitiu a culpa. ‘O Pimenta tem razão, mas ele está contribuindo com a investigação e fodendo a gente.’

(…)

Dilma Roussef só visitou a região afetada pelo maior desastre ambiental da história brasileira uma semana depois. Nos Estados Unidos, o presidente George W. Bush esperara dois dias para sobrevoar Nova Orleans – em agosto de 2005, o furacão Katrina devastou 80% da cidade (…). A demora veio a ser considerada uma das mais graves omissões de responsabilidade da história da Presidência norte-americana. No dia 12, a assessoria de Dilma finalmente a convenceu a ir a Governador Valadares (…). O Ibama, ligado à pasta do Meio Ambiente, resolvera aplicar multas no valor de 250 milhões de reais à Samarco (…). Caberia à presidenta anunciar a medida. No aeroporto de Valadares, ela fez uma reunião de emergência com os prefeitos das cidades atingidas e em seguida discursou. Foi um constrangimento. Primeiro, atrapalhou-se com o nome da empresa, que chamou de ‘São Marcos’. Depois, como que desconhecendo a gravidade da situação, afirmou que o rio Doce seria recuperado e ficaria ‘muito melhor do que era’. Por fim, anunciou a multa, da qual a empresa recorreria (e nunca pagaria). E se retirou.”