Michel Laub

Mês: agosto, 2017

Fim de semana

Um filme – Bingo, o Rei das Manhãs, Daniel Rezende.

Um filme pretensioso – De Canção em Canção, Terrence Malick.

Um livro – As Perguntas, Antonio Xerxenesky (Companhia das Letras, 184 págs.).

Um projeto – Sesc 24 de maio.

Um depoimento – Ruy Castro sobre alcoolismo (aqui).

Relevo e silêncio

Orelha que escrevi para A Cena Interior, de Marcel Cohen (Ed 34, 152 págs.), publicada com pequenas modificações:

Qual era o perfume preferido dos oficiais da Gestapo? Muito provavelmente, escreve Marcel Cohen neste livro breve e perturbador, um certo Couro da Rússia. Originado da Ucrânia, extraído de um galho de bétula que deixava um rastro “violento” e “inebriante”, a fragrância sugeria o contrário das suaves águas de colônia fabricadas à beira do Reno, símbolos da civilização liberal que morreu com a República de Weimar.

Dos perfumes, Cohen parte para digressões sobre roupas, paisagens, comida, fiapos de conversas contadas por testemunhas em cidades e épocas diferentes. São evocações do que a memória só consegue reconstituir – ou reinventar – em fragmentos: a biografia e os traços pessoais dos pais, tios, avós e da irmã ainda bebê que foram mandados a campos de concentração em 1943.

O resgate inclui a breve convivência de todos com o autor, que tinha cinco anos quando foi salvo da prisão e da morte porque havia ido brincar no parque com a babá. Como um espelho feito de ausência e silêncio, o registro de quem sobreviveu por acaso teve repercussões. Não apenas no trauma individual, sobre o qual A Cena Interior fala de modo discreto e enviesado, mas também em questões éticas de quem se propõe a contar por escrito uma história assim. Como ordenar os fatos e atribuir juízos de valor a eles?, Cohen se pergunta na introdução. “Seria inaceitável acrescentar às monstruosidades passadas a injustiça de sugerir que os materiais eram magros demais, que a personalidade dos mortos era pouco distinta ou (…) ‘original’ para justificar um livro.”

O impasse acaba resolvido de forma engenhosa, mesmo que o tom do texto busque uma neutralidade que, sabemos, é utópica em qualquer relato – seja ele de jornalismo, de testemunho ou de autoficção. Por meio do fragmento, do detalhe de aparência insignificante, do gosto por coincidências e associações inusitadas, além de um cuidado quase documental com os trechos mais impactantes da tragédia, a aproximação afetiva entre narrador e objeto se dá evitando na medida do possível a arbitrariedade – ou o autoritarismo – das articulações de ritmo, tom, pathos e demais artifícios – ou “mentiras” – que formam o tecido romanesco tradicional.

Paradoxalmente, é o sabor e a força dessa narrativa cheia de arestas e fios soltos que devolve aos seus personagens aquilo que lhes foi retirado pela brutalidade nazista: o relevo humano. Que não é feito da grandeza das peripécias, e sim dos pequenos hábitos, dos rituais íntimos que não servem para nada, da dignidade que independe dos humores sombrios da história do Século XX. Já definido como “escritor de voz baixa”, Cohen obtém aqui um efeito oposto: faz a vida gritar em sua imperfeição aleatória, seu presente universal garantido pelo registro da convenção literária. Trata-se do melhor antídoto contra a dissolução da experiência na frieza das estatísticas.

 

Fim de semana

Uma HQ – Aqui, Richard McGuire (Companhia das Letras, 304 págs.).

Uma peça – Marte, você está aí?, Silvia Gomez.

Um filme – O Apartamento, Asghar Farhadi.

Outro – Afterimage, Andzrej Wajda.

Um vídeo – Charlottesville na Vice/HBO (aqui).

Egopress

– Neste sábado (12/8, 11h), estarei no projeto Segundas Intenções, na Biblioteca Villa-Lobos, em São Paulo, numa conversa com Manuel da Costa Pinto.

– Na sequência, como parte do programa Viagem Literária/SP, darei palestras em bibliotecas públicas de cinco cidades: Ilha Comprida (21/8, 19h), Itanhaém (22/8, 19h), Praia Grande (23/8, 13h), Cubatão (também em 23/8, 19h) e Diadema (24/8, 19h).

– Ainda em agosto, com mediação de Vivian Schlesinger, participo de uma mesa da Feira Literária do Clube Paulistano/SP (26/8, 19h).

– No novo número da revista Versalete, da UFPR, respondi a perguntas de Sandra M. Stroparo no estilo ‘Questionário Proust’. PDF da edição: https://goo.gl/nkiz7y

– Participação minha no Encontros de Interrogação do Itaú Cultural, em 2014 (o vídeo foi posto no ar este mês), no estilo TED (pediram para eu subir no palco e dizer o que quisesse): https://goo.gl/AtV2Kj

 

Fim de semana

Um filme – Wizard of Lies, Barry Levinnson.

Outro – Dunkirk, Christopher Nolan.

Uma exposição no Masp – Toulouse Lautrec.

Outra (com vidros que refletem) – Miguel Rio Branco.

Um obituário – Maria Emilia Bender sobre Elvira Vigna na Piauí.