Trechos de Pavões misteriosos, de André Barcinski (Três estrelas, 239 págs.), livro sobre a música pop brasileira no período 1974-1983.
Créditos (1) – “Na semana de lançamento do LP internacional de Água viva [em 1980], um disco parecido chegou às lojas. Não era da Som Livre, mas da Continental. Água viva – temas internacionais da novela (…) tinha um repertório idêntico ao do LP da Som Livre (…). Escondida no canto da capa, em fonte pequena, constava esta palavra: Covers (…). Hélio Costa Manso [diretor da Som Livre] (…) não teve dúvidas: aquilo só podia ser obra dos Carbonos (…). Muita gente chegava na loja e pedia o ‘disco da novela’ e saía de lá, feliz da vida, com a versão cover (…). Trinta e três anos depois do episódio (…) Beto Carezzato, baixista dos Carbonos, bate os olhos na capa (…) e diz: ‘É, acho que participamos desse estelionato!’.”
Créditos (2) – No fim dos anos 1970, auge do mercado de versões no Brasil, a indústria do disco virou um ringue de telecatch, onde vencia quem era mais esperto. E ninguém era mais esperto do que Carlos Imperial. Alguns anos antes, ele descobrira o lucrativo e inesperado filão das músicas de domínio público e passou a registrar várias em seu nome. Na biografia Dez! Nota dez: eu sou Carlos Imperial, o autor, Denilson Monteiro, conta que até a mãe de Imperial se indignou quando ele registrou Meu limão, meu limoeiro: ‘Carlos Eduardo, como você tem coragem de dizer que essa música é tua? Meu filho, eu cansei de te embalar cantando ela quando você era recém-nascido!’. Imperial respondia: ‘Comigo é assim: mulher e música, se não tiver dono, eu vou lá e apanho.’”
Critérios – “O jabá, ou jabaculê, era visto como uma coisa normal (…). Porém, de vez em quando, o olho grande de alguém provocava atritos. Quando André Midani soube quanto Chacrinha estava exigindo para apresentar Baby Consuelo e Pepeu Gomes em seu programa, resolveu ir à imprensa e protestar. (…). ‘Eu disse para André: pelo amor de Deus, não faça isso, vai acabar com a gente’, lembra [Marco] Mazzola, que trabalhava com Midani na Warner. ‘Dito e feito: quando cheguei à empresa, na segunda feira, o departamento de divulgação inteiro estava me esperando (…). As rádios cortaram todas as nossas músicas da programação. A gravadora levou uns quatro ou cinco anos para se levantar.’ (…) O filho de Chacrinha, Leleco Barbosa, disse à Folha de S.Paulo, em 2003, que o que havia não era ‘jabá’ (…): ‘A gravadora queria botar no programa o artista tal. Se papai gostasse, botava. Mas, como produzia shows com artistas, chacretes e calouros, a ‘caravana’, fazia uma troca (…). Era uma coisa mais que justa. Se o cara queria se lançar no programa, ia ao show em contrapartida.’”
Casting – “O carioca Sidney Magalhães era apenas mais um cantor de bares e restaurantes do Rio de Janeiro. Foi em uma churrascaria da Barra da Tijuca que o produtor musical Roberto Livi o viu pela primeira vez (…). Livi, um cantor argentino que gravara sucessos no Brasil na época da Jovem Guarda (…), tinha planos de criar um clone brasileiro de um grande astro pop do seu país, o cigano Sandro (…) O cantor (…) passou a se apresentar com a camisa aberta no peito, mangas bufantes, colares e uma vasta cabeleira cacheada (…). Livi decidia tudo: repertório, figurinos e até o que Magal deveria dizer em entrevistas (…). Quando o Fantástico produziu um clipe da música [Sandra Rosa Madalena], apresentou Magal como ‘descendente de ciganos’.”
Casting (2) – “Além de Simony, a CBS contratou [para integrar o Balão Mágico] um menino chamado Vimerson Benedito, de dez anos (…). Como Vimerson não era o nome mais apropriado para um pop star, a gravadora rapidamente arranjou-lhe um outro: Tob. O grupo se completou com Mike, de seis anos, filho do inglês Ronald Biggs, o famoso assaltante do trem pagador (…). Em abril de 1981, [Biggs] foi sequestrado por um grupo de mercenários britânicos que queria leva-lo de volta à Inglaterra e exigir uma recompensa do governo do país. Mike apareceu na TV fazendo um apelo emocionado pela libertação do pai. Os executivos da CBS ficaram impressionados com o carisma do menino e o contrataram.”
Apoio – “Desde Secos & molhados, nenhum disco de estreia no Brasil fizera tanto sucesso quanto Voo de coração [de Ritchie]. Quando foi gravar o segundo disco, E a vida continua, o cantor sentiu certa má vontade por parte da CBS (…). Não entendia como havia passado, em tão pouco tempo, de prioridade a estorvo. Até que leu uma entrevista de Tim Maia à revista Isto É, em que o ‘Síndico’ afirmava que Roberto Carlos, o maior nome da gravadora, havia ‘puxado o tapete’ de Ritchie (…). Claudio Condé, da CBS, nega: ‘Isto é viagem. O Roberto nunca teve esse tipo de ciúme.’ (…) Anos depois, quando fazia um show em Angra dos Reis, o cantor foi procurado por um homem, que se apresentou como radialista e lhe disse: ‘Há anos quero te contar isto. Quando você lançou A mulher invisível, aconteceu algo que eu nunca tinha presenciado em mais de trinta anos de carreira no rádio: eu ganhei um jabá da sua própria gravadora para não tocar a sua música!’.”
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