Ainda se faz grande jornalismo por aí, e na essência ele continua o mesmo. O que mudou foi o modo como as notícias são consumidas: na esteira da eleição de Trump, Bolsonaro e seus colegas populistas e autoritários mundo afora, já virou clichê falar da crise da informação diante do reinado da opinião e da propaganda.
É com algum sentido histórico, portanto, que lemos “Repórter”, as memórias do jornalista americano Seymour M. Hersh (Todavia, 384 págs, tradução de Antônio Xerxenesky). Em vários aspectos, trata-se de um documento sobre o que o autor chama de “era de ouro” – pré-redes sociais, em alguns casos pré-onipresença televisiva, quando as mentiras de governos, corporações e outras instâncias de poder eram combatidas com o simples relato dos fatos.
Antes de mais nada, o livro é um depoimento sobre a carpintaria e os dilemas éticos do ofício que tornou esse combate possível. Hersh fala de técnicas de apuração, das relações delicadas com fontes, da busca sempre acidentada por documentos e pessoas que confirmem histórias difíceis. Suas credenciais para a empreitada falam por si: entre outros furos, foi ele que revelou o massacre de civis por soldados em My Lai, durante a guerra do Vietnã, em 1968; a espionagem da CIA contra seus próprios cidadãos, sob a complacência dos governos Johnson e Nixon, nos anos 1960/1970; e as torturas sofridas por prisioneiros em Abu-Ghraib, na sequência da invasão do Iraque, em 2003.
Trecho inicial de texto publicado no Valor Econômico, 10/5/2019. Íntegra aqui.
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