Visões do Áporo

por Michel Laub

Uns anos atrás, eu diria que as influências mais visíveis nos textos de novos escritores brasileiros eram Clarice Lispector, Guimarães Rosa e Rubem Fonseca. Hoje o estilo de Clarice segue muito imitado, talvez porque se confunda a complexidade de sua estética com mera confissão intimista, algo em voga num tempo egocêntrico como o nosso.

Na via oposta, o registro quase automático do umbiguismo das redes sociais, em geral falando de universos urbanos e não muito épicos, diminuiu um pouco a presença de Rosa. E Rubem Fonseca praticamente sumiu. Por bons e maus motivos, suas duas grandes características – o brutalismo masculino cínico e a ambição de reproduzir a voz de outras classes sociais e universos – entraram em choque com o principal modelo ficcional contemporâneo: a jornada inspiradora narrada com autoridade biográfica por minorias.  

Se autores vêm e vão na bolsa das influências, o que depende de fatores que estão dentro e fora da literatura, outros traços são mais constantes entre quem está começando no metiê. Há cacoetes, clichês que podem até ser lidos sob uma perspectiva histórica, cultural, mas que numa dimensão imediata ainda pertencem ao domínio da técnica. Esse é o tema de O Lugar das Palavras, de Vanessa Ferrari, ensaio curto e bem-vindo num mercado ainda carente de títulos sobre o ofício da escrita (Moinhos, 102 págs.).

Trecho de texto publicado no Valor Econômico, 5/10/23, sobre o livro de Vanessa e Escrita em Movimento, de Noemi Jaffe.